Thursday, March 29, 2007

Reforma da Previdência

Como dito aí embaixo, o PDT não ganhou a Previdência porque vai haver nova reforma. Do site do UOL:

"Lula afirmou ainda que não entregou a Previdência para Carlos Lupi, presidente do PDT, porque sabe que ele teria dificuldade dentro do seu partido para realizar mudanças necessárias na área previdenciária. "Trouxe o Lupi para o Trabalho. A imprensa vazou que seria a Previdência. Por que [ele não ficou com a Previdência]? Primeiro porque conheço o pensamento do PDT. Porque era muito complicado colocar companheiro para fazer política na Previdência sabendo que para seu partido essa é uma coisa de fé. Ele teria dificuldade em alguns temas que vamos ter que discutir para as futuras gerações.""

César Maia faz apologia ao crime

O Ex-Blog do ex-cidadão dentro da lei César Maia hoje faz apologia do crime e prega abertamente a oficialização do STE como puteiro do PFL. Diz que a decisão sobre fidelidade partidária mostra que o PFL é um partido de verdade. Como já dissemos anteriormente, o Brasil assistiu a um golpe de estado essa semana.

Wednesday, March 28, 2007

O golpe dos Democratas

Vejam como é a lei no Brasil: um trabalho miserável para fazer reforma política, todo mundo dizendo que era impossível, mas foi só o PFL resolver que duas mudanças, uma importantíssima, aconteceram essa semana.

Primeiro: acabou a exigência dos partidos terem nomes que começam com "P". Parece besteira, mas o PMDB não conseguiu mudar isso, o PSOL não conseguiu mudar isso, mas foi só o Bornhausen mandar que sua turma no judiciário resolveu que tá beleza; o novo PFL se chamará "Democratas", o que não apenas desmoraliza a grande herança ateniense, também avacalha a reputação de um excelente clube na Lapa, onde acontecem alguns dos melhores shows de samba do Rio de Janeiro.

E, Segundo, importantíssimo: resolveu-se que os deputados que mudarem de partido podem perder o mandato. Porra, isso é um assunto seríssimo, um dos pontos mais disputados da reforma política, ninguém nunca conseguiu fazer, mas, eis que, assim que o PFL começou a perder deputados para o governo, e pronto: não pode mais trocar de partido. É o mesmo raciocínio que fez o PFL virar moralista assim que perdeu a boquinha do governo.

Isso é um escândalo: as duas medidas são corretas, e seriam bem-vindas, mas, assim como não desejo ver as políticas que apóio implementadas à força, também não as quero feitas na base da sacanagem, somente com o objetivo de beneficiar no curto prazo a quadrilha de desesperados com mais poder dentro do judiciário.

Certo, certo, tudo isso ganhar uma certa comicidade pelo fato de que o líder do novo partido é o excelente Rodrigo Maia, a mais tosca cavalgadura a jamais tropeçar nas raias do Congresso, que certamente fará a alegria dos humoristas. Mas, mesmo assim, é sério.

PDT fora da Previdência

Sinal importante na formação do ministério: quando todos contavam que o PDT ia pegar a Previdência, Lula deu para os brizolistas o Trabalho (não a tendência trotskysta, que nem no PDT aguentariam ela, mas o Ministério). Visto que os pedetistas diziam que queriam a Previdência para garantir que não houvesse qualquer reforma, o deslocamento é significativo. Talvez Lula mexa na previdência, afinal. Se for para fixar a idade mínima e desvincular o benefício básico do mínimo, o blog apóia.

Tuesday, March 27, 2007

Paulinha!

E este blog está cada vez mais bem freqüentado. Depois do venerável Marotta, recebemos a visita da genial Paulinha Vermeersch, grande historiadora da arte, legítima cebrapolina e possuidora do melhor nome de autora entre as pessoas que eu conheço. Lembro do comentário de seu orientador: "Porra, eu me chamo Josué Pereira da Silva, quem vai lembrar meu nome?". Já Vermeersch, é outro papo. E o blog dela, o Nel Mezzo del Cammin, já está adicionado aí do lado.

Monday, March 26, 2007

Grande Marotta!

Este blog pode ser ruim, mas é muito bem freqüentado! A partir de agra constará aí do lado o link para o blog do genial Marcelo Marotta, sujeito cem por cento e inteligente pra cacete, especialista em Etrúsia (sem sacanagem). Na verdade, são dois blogs: em um, o Melancholy Lakes, o Marotta posta seus poemas e desenhos, e no outro, o Pallette des Muses, suas opiniões mais gerais. Seja bem-vindo, rapaz!

Friday, March 23, 2007

Governo Lula II

Duas iniciativas excelentes: o plano de educação do Fernando Haddad, estabelecendo indicadores de qualidade para as escolas e piso salarial nacional par aos professores, e a poupança-escola, que deposita um troco pra molecada, que pode ser retirado quando o moleque fizer dezoito anos.

Agora que já falamos das coisas boas: o ministério está me saindo uma merda. Nem Gerdau, nem Delfim, nem Ciro, nem nada. Aldo na defesa pode dar certo. Gostei bastante de deixarem o Haddad na educação, estava desesperado da Marta pegar. Pelo amor de Deus, o presidente do PDT na Previdência, ou em qualquer coisa que seja, não. O cara da saúde pelo menos não me desperta desespero. Mas agricultura, desenvolvimento, integração nacional, foram de chorar.

E, como notou o André: ninguém nem fala no ministério de ciência e tecnologia. Ninguém pediu, não deram pra ningúem. Que maravilha. Isso é que é país com as prioridades certas.

Thursday, March 22, 2007

Clipe da semana: "Where is my mind?" - Pixies

Recomendado pelo glorioso Valter, grande financista pós-punk.

Unger

Correção do último post: além do OC, há, sim, um autor brasileiro que tem uma página cheia de textos, o Mangabeira Unger (bem mais ao gosto de nóis aqui).

Aliás, boa notícia para o pessoal esquerdoso como eu: saíram dois livros do Unger, The Self Awakened e What should the left propose?, já encomendei, qualquer hora deve sair em português. o The Self eu já comentei aqui, estava disponível até outro dia na página do Unger, inteirinho, como, aliás, estão outros livros ainda não publicados. Chequem rápido, antes que publiquem: camarão que dorme a onda leva.

Wednesday, March 21, 2007

Blogosferas à direita

Como já disse antes aqui, é notável que a blogosfera brasileira seja maciçamente de direita (no bom sentido, sem julgamento de valor). Até agora, achei pouquíssimos blogs de esquerda brasileiros, menos ainda da esquerda não-bolchevique. Não estou falando de figurões que fazem blogs, mas sim dos blogs mais ou menos amadores (como esse).

Segue um guia das blogosferas liberal e conservadora, aproveitando para chamar a atenção para conflitos recentes entre elas.

Sem sombra de dúvida, na origem de muitos sites da blogosfera direitista brasileira está a influência do Olavo de Carvalho, que, vale dizer, foi o primeiro autor, que eu saiba, a utilizar amplamente os recursos da internet para divulgar suas idéias. Não há, creio, outro autor brasileiro com uma página tão cheia de material quanto a do OC.

Entre os discípulos do OC, destaca-se como referência dos outros, sem sombra de dúvida, o Pedro Sette Câmara, cujo blog, O Indivíduo, tem uma frequência bastante alta, e uma história polêmica. Lá pelos idos dos anos noventa, o Sette Câmara e outros frequentadores dos cursos do OC lançaram, na PUC, um jornalzinho, O Indivíduo, que defendia idéias conservadoras. Houve quem achasse que um artigo do Sette Câmara sobre cotas raciais era racista, a coisa, se não me engano, terminou em porradaria entre estudantes, o reitor da PUC entrou no meio da história, o JB (creio) fez uma reportagem sobre a infiltração conservadora na PUC, vários intelectuais brasileiros foram chamados a opinar, o próprio OC saiu em defesa dos moleques na TV e no jornal, enfim, uma farra. O jornalzinho evoluiu para um blog, atualmente feito exclusivamente pelo Sette Câmara. Recomendo vivamente pelas dicas de poesia (inclusive com boas traduções), mas, politicamente, acho meio bobo. A idéia é combater a esquerda na esfera da cultura (até aí, beleza), e, como resultado, as posições políticas defendidas (por exemplo: se todo Estado é opressor, somente as cidades-estado são razoávelmente livres, ou algo desse tipo) são mais utópicas que as do PSTU, e de que nos serve um conservador utópico? Conservador serve quando é pé-no-chão.

Em linha um pouco diferente vai a turma do Wunderblogs, uma espécie de diretório de blogs mais ou menos direitistas, em geral de tom literário e, por vezes, meio infantilmente esnobe. É um bom lugar para encontrar citações de Nelson Rodrigues, mas também de Paulo Francis, que dita mais ou menos o estilo dos blogs. Alguns dos caras escrevem na Bravo! (onde já escreveu, e tomou um toco em um debate sobre macartismo, OC), e um livro com o melhor dos vários blogs foi editado. No geral, bem escrito, muito frequentemente com ambição intelectual acima do que podem os autores. Se eles forem novos (não os conheço), tá ótimo. Se tiverem passado dos trinta e poucos, já estava na hora de saber fazer coisa melhor. Para quem quiser ver o que dizem os wunderbloggers, sugiro uma passada no Vertigem, do Bruno Garschagen, e no Alexandre Soares Silva, desafortunadamente acronimificado (?) como ASS.

Passando para o lado mais propriamente liberal da blogosfera, destaca-se o site do Instituto Millenium, uma iniciativa interessante de alguns economistas liberais, juntamente com uma parte da turma do OC. Entre seus manda-chuvas está o Paulo Guedes, que é, sem dúvida, muito inteligente, mas a média dos artigos postados no site é, sinceramente, muito fraca. No extremo do libertarianismo (aquela turma que não é chegada em Estado de qualquer tipo, em circunstância nenhuma), um sujeito chamado Lucas Mendes bloga sobre a escola austríaca de economia e coisas do gênero no blog Austríaco.

Os interesados encontrarão muito mais links em cada um dos blogs acima, que poderão levá-los a sites de economia ou aos cismáticos de Lefébvre (não sabe o que é isso? É porque não é um direitista que se preze :) . A lamentar, o flerte com o que há de mais fecalmente leproso na direita americana, como links para o site da Ann Coulter (não, não vou linkar, por questão de higiene).

Recentemente, um fato interessante: um quebra-pau entre o OC, o manda-chuva de metade desses caras, e um blogueiro liberalzão, ligado ao Instituto Millenium, o Rodrigo Constantino, que, fiel a uma vertente tradicional do liberalismo, é radical defensor do laicismo. A coisa ficou preta, e o OC acabou escrevendo um artigo chamado "Porque não sou liberal". O negócio esquentou ainda mais quando o Constantino resolveu descer o malho no Papa pela singela declaração sobre segundos casamentos, provocando uma irada resposta do Pedro Sette Câmara.

Em que medida esses caras refletem algum movimento tectônico na cultura brasileira?Não tenho a menor idéia, mas, como há muito suspeito que uma hora dessas a direita vai voltar a ser uma força política importante para além do fisiologismo e do controle dos ministérios econômicos, é meio preocupante que suas idéias em gestação sejam tão confusas, ou, muitas vezes, tão ruins.

Como esquerdista, isso me preocupa, pois sei que a esquerda teria muito a ganhar com a concorrência de um partido de direita minimamente higiênico: seria forçada a se livrar de muita bagagem ideológica burra. Mas, enfim. É assim mesmo.

Friday, March 16, 2007

Browsers

Não deixem de ver lá na página do Zé um excelente discussão dos vários browsers disponíveis no mercado atualmente, inclusive com dicas de add-ons bem bacanas. Eu gosto do Firefox, ainda não conhecia o Sea Monkey.

Fora Collor

"Todo mundo se dando bem e só eu vou levar uma tareba no c*?"
- Rogério Magri, membro do "ministério de craques" de Collor.

Collor ontem foi ao Congresso dizer que seu impeachment foi uma grande farsa. Aparentemente, conseguiu que parte da facção "leprosário moral" do Congresso se sensibilizasse. Entretanto, qualquer um que não esteja levando um por fora há de admitir o seguinte:

Ninguém provou nenhuma das acusações contra Collor, mas, até aí, ninguém provou nada contra nenhum dos mensaleiros, e nem vai provar, porque as investigações, em ambos os casos, foram mal conduzidas, e as denúncias tinham mais o objetivo de fazer os caras perderem o cargo do que de desvendar o crime. Isso não quer dizer, obviamente, que os crimes não tenham acontecido.

Collor cometeu o maior crime contra a economia popular da história do Brasil, o confisco da poupança. Até, aí, nada. O melhor é que se elegeu dizendo que seu adversário faria, se fosse eleito, o que ele mesmo veio a fazer. Ou seja: é o grau zero do caráter. E: o confisco não adiantou porra nenhuma, a inflação voltou rapidinho. Leiam o Pastore sobre o assunto.

E, talvez, o pior: Collor mobilizou um pequeno, mas dinâmico e valoroso, setor da elite de inclinação democrática e liberal, que, depois da catástrofe de seu governo, se viu completamente desmoralizado. Não sei se há como medir isso, mas me lembro claramente de jovens colegas, adversários valorosos, que se desiludiram da política por causa do vagabundo. Como resultado, a década seguinte viu uma sucessão de governos liderados por quadros de esquerda que precisavam aplicar políticas ortodoxas, sem, entretanto, contar com qualquer respaldo da opinião pública para as reformas de mercado (associadas ao Collor). FHC precisou comprar a opinião pública com o populismo cambial para fazer suas reformas, Lula foi atingido no meio do mandato por não ter feito algo do gênero.

Como eleitor da esquerda, sou o primeiro a dizer que o Brasil ganharia muito se tivesse uma direita liberal consistente, que, inclusive, ajudasse, em um debate lúcido, a corrigir certas besteiras da esquerda. Collor abortou o surgimento dessa direita, travou o início de nossa democracia, e seu legado é só esse. As boas iniciativas, como a abertura econômica, acabaram sendo contra-producentes, pois contribuíram para a associação das reformas de mercado com a corrupção.

Muito pouca gente fez mal ao Brasil como Collor. Que ele tenha a vergonha na cara para nos livrar de sua presença e de sua lembrança.

Wednesday, March 14, 2007

O Socialismo Petista (2)

Continua, no site do PT, o debate sobre “O Socialismo Petista”. Seguem nossos comentários sobre os textos postados:

1) Mais um texto de Valter Pomar (pelas minhas contas, o qüinquagésimo quarto): desenvolvendo a perspectiva do primeiro artigo publicado no site, neste segundo artigo Pomar fala ainda menos do tema proposto. Aparentemente, o socialismo é um negócio bom, que o pessoal ruim não gosta. A cada texto, Pomar diz menos. No próximo provavelmente vai se limitar a desenhar uma casinha.

2) E mais um artigo, de quem, de quem? De Valter Pomar, provando o quão sábio foi antes em não dizer nada. Tanto quanto há um argumento aqui, é o seguinte: uns manés estão tentando incorporar elementos do liberalismo (os “valores republicanos”) ao socialismo, sem compreender que isso é ruim. O bom é o socialismo, que, entretanto, deve ser democrático, com controle social sobre a propriedade estatizada (podemos supor que todos os direitos políticos seriam 100% garantidos? Eu não arriscaria). Por algum motivo, a propriedade estatal dos meios de produção não produz as desigualdades de poder produzidas pela propriedade privada. O déficit democrático das experiências socialistas do século XX é culpa do capitalismo: como essas sociedades eram atrasadas, tiveram que adotar alguns métodos do capitalismo, e, como diz Pomar, “quanto mais capitalismo, menos democracia!”. Que a estrutura econômica soviética era muito parecida com o capitalismo era claro, mas quem vai dizer que, atualmente, quando uma estrutura econômica semelhante convive com os direitos de propriedade burgueses e a democracia “burguesa”, por exemplo, na Hungria, há menos democracia do que na época de Rakosy e Stalin? Constrangedor.

3) Elói Alfredo Pietá: essencialmente, defesa do governo Lula, definido como de centro-esquerda. Parece ser mais um caso em que o autor já é social-democrata (parabéns para ele), mas está meio sem-jeito de dizer.

4) Flávio Murilo da Silva Loureiro: não dá nenhuma informação sobre como deve ser o socialismo, mas afirma que a social-democracia é ruim.

5) Archimedes Silva: Cuba, Chávez e o Lynux são bons. O capitalismo é ruim. A tese da radicalização democrática é reafirmada em termos mais concretos do que na maioria dos outros textos, com uma defesa da volta dos conselhos populares, essas coisas. Até aí, beleza, mas: meu filho, não tem nada disso de democracia radical (nem moderada, nem mesmo uma beeeeeem calminha, quase entrando em coma) em Cuba, não. E: porque o capitalismo com isso tudo seria socialismo? E se não fosse capitalismo, porque não seria como Cuba?

6) Maria Aparecida Carneiro: eu adoro esses textos só com perguntas: O socialismo, ele é possível? Ele é petista? Ele pode ser democrático? E o Lula? É petista? É socialista? É democrático? E eu? Sou o que? Sou o Lula? Sou petista? Sou democrático? Lembremos sempre que a culpa é do capitalismo pós-moderno. Que beleza.


E agora, me digam: com um background teórico desses, a melhor opção não é ser o mais moderado possível?

Monday, March 12, 2007

Seattle sequestrada

Vendo os depoimentos dos manifestantes anti-Bush, e observando in loco os últimos remanescentes da dispersão pela polícia (trabalho na Paulista), tive uma sensação meio ruim, que já vinha tendo sempre que lia o Indymedia brasileiro: o movimento de Seattle foi sequestrado pela velha esquerda.

É obviamente legítimo protestar contra Bush, cuja estratégia para o Iraque se revelou flagrantemente horrorosa. Agora, há várias coisas que podem ser ditas diante do problema Bush, e não me parece que os manifestantes, ou que a turma do no-global, ou do "altermundismo", estejam dizendo as mais inteligentes.

Em primeiro lugar, o Iraque: sempre fui contra a guerra do Iraque, por achar que só se faz guerra em último caso. A justificativa para começar era ruim, e a confiança inspirada por Bush (que afundou Blair no processo) era zero. Agora, há dois argumentos usados pelos manifestantes que não me convencem absolutamente:

1) É sempre errado invadir o país dos outros. Isso me parece um absurdo grotesco: o Vietnam invadiu o Camboja e interrompeu o massacre do Khmer Vermelho; o que há de errado nisso? Os aliados invadiram a Alemanha e derrubaram Hitler: o que poderia ser mais certo? Se alguém tivesse invadido Ruanda e impedido o massacre, os altermundistas se oporiam a isso?

2) Os EUA são um Império mundial, e por isso combatê-los é lutar pela liberdade. Essa é realmente triste. Os EUA são um hegemon: eles são mais poderosos do que os outros países, e por isso ditam a agenda internacional. Não há nada que diga, de antemão, que essa agenda será boa ou ruim: isso dependerá dos interesses de cada país ou classe social, e da negociação política. Resistir cegamente aos EUA só serve aos interesses de hegemons alternativos, em geral regionais. Quando os altermundistas fazem isso, seguem os reflexos da velha esquerda, que defendia sempre os interesses geopolíticos da URSS. Porque continuar com a mesma leitura do mundo agora?

Também é notável a mudança de autores citados. Me lembro de Hardt escrevendo no Guardian sobre o risco do anti-americanismo ("Porque apoiar um reacionário como Chirac?"), me lembro de Monbiot escrevendo, no mesmo jornal, "I was wrong about trade", reconhecendo que a defesa do livre-comércio pode muitas vezes ser do interesse dos oprimidos. Não vejo mais ninguém citando essa turma, que dava a tônica do debate altermundista nos anos 90, no site do Indymedia, mas vejo toda a velharada: o PSTUpido, o PCO, os velhos stalinistas de sempre, e, suprema aberração, uns maoístas. Um cartaz preso num poste da paulista por uns trotskos meio toscos conclama uma reavaliação do movimento pela paz, que deve ser redirecionado para uma revolução anti-imperialista.

E, o mais triste: é comum que se leia no Indymedia brasileiro manifestações francamente anti-semitas, como as charges de um tal de Latuff, premiado no concurso iraniano de charges sobre o holocausto. A infiltração, que já era um risco nos velhos tempos da velha esquerda, agora é aberta, pelo sequestro de uma bandeira do altermundismo, o relativismo cultural.

O altermundismo de Seattle sempre teve o potencial de virar uma merda: estava francamente errado sobre muitas coisas. Mas era, sem dúvida, uma erupção de dinamismo político saudável, e tinha o potencial para se reformar e tornar-se a base de uma esquerda mundial inteligente. Entre as muitas vitórias de Osama está essa: após o 11 de Setembro, quando surge o conflito entre o capitalismo global e um ultra-reacionarismo cultural, Seattle, ainda sem uma boa análise das possibilidades de uma nova política mundial - que dependeria, fundamentalmente, da democracia - é sequestrada pela paleoesquerda anti-americana.

Não por acaso, os movimentos de protesto contra a OMC param quando a reunião é em Doha, Emirados Árabes, onde, evidentemente, nenhum protesto é permitido. Ninguém soube ler essa situação? Daí em diante, Bush invade o Iraque, e Seattle se perde no meio do movimento contra a guerra, puramente reativo e fortemente marcado pelo discurso da velha esquerda.

Perdeu-se uma chance.

Livraço: "Jerusalém" de Gonçalo Tavares

Embora resvale às vezes para o essemundoéumamerdamesmismo, é um romance muito denso, muito belo, e terrível. Há momentos realmente lindos, como quando você descobre o porque do título. A história: uma dona meio panqueca casa com um psiquiatra que quer escrever um tratado sobre os grandes massacres da humanidade. Tão doida é a dona que o marido interna ela num hospício, onde ela se apaixona por um esquizofrênico e fica grávida de um moleque meio maluco e deficiente. O marido larga ela no hospício, mas pega o moleque para criar. Aí é que as coisas começam a piorar.

Pois é, dito assim parece ruim, mas é bonito pra caramba, sim. Tavares é considerado um dos grandes nomes da nova literatura portuguesa.