Josué (que sucederia o Ianni na cadeira de Teoria Sociológica alguns anos depois) perguntou a Ianni se sua abordagem não era ainda excessivamente impregnada da perspectiva centrada no trabalho: isto é, seu sua análise da globalização não era, de certa forma, ainda baseada na perspectiva de que a sociedade é o modo de produção, e, portanto, visto que o modo de produção capitalista tende a se expandir globalmente (vide Manifesto Comunista), o grande movimento da modernidade seria a globalização.
Josué, como os presentes sabiam (e mais gente deveria saber) foi o introdutor, no Brasil, do debate sobre a crise da sociedade do trabalho, algo mais ou menos assim: com as tecnologias que poupam trabalho, a crise das utopias do trabalho (como o socialismo), a diminuição quantitativa da classe operária, a crise dos sindicatos, e os welfare states que tinham condições de redistribuir a renda cada vez maior gerada por cada vez menos trabalho, o foco do pensamento crítico deveria cair sobre
(1) as maneiras de diminuir o peso do trabalho na vida social: reduzir a jornada de trabalho, garantir espaços para o trabalho autônomo, e desvincular a sobrevivência do trabalho (através de programas de renda básica); e
(2) garantir a justa distribuição das oportunidades de trabalho remanescentes, através de políticas de igualdade de oportunidade típicas do welfare state (educação universal, etc.). Em suma, valorizar o cidadão antes do trabalhador. Se o Ianni estava mais preocupado com a acumulação capitalista em escala global, o Josué se preocupava mais com a constituição de uma esfera pública mundial, organizada sobretudo a partir de movimentos pós-crise do trabalho, como o movimento ambiental.
O Josué tirou a maioria dessas idéias do André Gorz, que escreveu um dos melhores livros que eu li na vida (Adeus ao Proletariado). Josué defendeu doutorado sobre Gorz na New School de NY (com a Seyla Ben Habib na banca), e foi, na verdade, um dos primeiros caras no mundo a estudar Gorz mais a fundo. Mas sua perspectiva era ampliada pela leitura extensa da turma do Habermas (Arato, Cohen, Honneth), que lhe despertaram a preocupação com a questão da cidadania, a democracia, etc. Lembremos que, nessa época, Habermas estava publicando um artigo sobre a ONU, mostrando que a preocupação com a cidadania global era forte.
Na época o Josué era muito atacado pela galera mais ortodoxa, que não topava tirar o foco conceitual do trabalho de jeito nenhum. Lembro em sala de aula um estudante marxista levantando duas objeções ao Gorz: (1) a sociedade para Marx não é só trabalho e (2) há diversas formas de trabalho: físico, mental, artístico,..., ao que o Josué respondeu: parece que uma das afirmações contradiz a outra. O cara é bom, mesmo.
Wednesday, December 13, 2006
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