Tuesday, July 31, 2007

Tyler Cohen no EconTalk

Se vocês forem ouvir um só economista falar esse ano (bom, se não forem, eu entendo), ouçam esse podcast do Tyler Cowen, do Marginal Revolution, no EconTalk.

Entre as idéias do cara: algumas formas de regulação de mercado equivalem à defesa dos direitos de propriedade. Por exemplo, se você compra um leite estragado, pode processar a empresa e recuperar sua grana. A vigilância santiária simplesmente evita esse tipo de fraude, e, da mesma forma que as cortes, protege o seu dinheiro. Nesse e em outros casos, o que devemos decidir para defender os direitos de propriedade é se confiamos mais na agência reguladora ou nos tribunais (aqui no Brasil a escolha é dura, hein?).

E mais um monte de comentários interessantes sobre arte, culinária, teoria econômica, e as mais variadas coisas. Assim que tiver grana vou comprar um livro desse cara. Enquanto isso, leio o Marginal Revolution, o blog dele, linkado aí do lado. Aliás, para quem ainda não viu: uma das diversões da blogosfera no momento é descobrir o blog secreto do Tyler Cowen, que só envia o endereço para quem compra o livro dele antecipadamente. O trato é: quem achar não revela. Ainda não achei, não.

Esses dias entra aí o link do EconTalk, uma boa idéia que deveria ser mais explorada.

FP e os economistas

A Foreign Policy fez uma lista das "cinco mentiras que o seu economista já te disse". Concorde-se ou discorde-se, ficou engraçado. Na verdade, o que a lista mostra é que é difícil pra caramba isolar certas relações empíricas dos milhões de outros processos que acontecem ao mesmo tempo.

Novidades

Coloquei hoje aí do lado a licença do Creative Commons (citem o que quiser, mas não cobrem por isso, nem modifiquem a citação) e o widget do Free Exchange, blog da The Economist. Se alguém achar que ficou pesado, diga.

Dworkin

A excelente Novos Estudos CEBRAP publicou uma entrevista (em Março, vi atrasado) com o filósofo e jurista norte-americano Ronald Dworkin.Tem um argumento interessante sobre cotas raciais:

"Eu defendo que uma sociedade sem sem preconceito racial e sem esterótipos tem probabilidade maior de ser justa na distribuição de riquezas e também tem maior probabilidade de ser melhor para todas as pessoas, em muitos outros aspectos. Parece-me que a questão ao Brasil é se as cotas em discussão tornariam a sociedade melhor no futuro, nesses aspectos. Não acho que um suposto direito à compensação deveria figurar no argumento".

Esse é o argumento mais difícil de julgar no que se refere à ação afirmativa: há um efeito auto-reprodutivo na discriminação, que é difícil de medir e de combater. Se uma circunstância histórica qualquer - como a escravidão africana - faz com que não haja negros entre a elite, o preconceito de que negros não têm capacidade, ou de que casar com negros é decair socialmente, ou que negros são ignorantes, ou que negros têm maior probabilidade de serem bandidos ou maus alunos - tende a se formar. Uma vez estabelecido, o preconceito reproduz a segregação: os negros são preteridos em promoções, a cor negra é associada ao fracasso e à pobreza (e não à liderança e ao sucesso, traços desejáveis em muitas das melhores profissões), quando não à imoralidade (daí que atrizes negras tendem a se destacar em papéis de gostosas vagabundas, enquanto atrizes brancas são "namoradinhas do Brasil"). Isso mantém os negros fora da elite, o que, por sua vez, etc, o ciclo se reproduz.

A ação afirmativa, se bem-sucedida, favoreceria o surgimento de lideranças negras, empresários negros, intelectuais negros, sacerdotes negros, etc.Essas figuras, por sua simples existência, aos poucos minariam a idéia de que negro é igual a fracasso. Isso diminuiria o preconceito dos brancos e, muito mais importante, daria modelos de comportamento para os jovens negros, que passariam a aspirar mais do que serem esportistas ou cantores de rap.

Que o fenômeno que se quer combater existe é inegável, mas também é inegável que é muito difícil medir o quanto ele é forte em cada situação concreta. Isso faz com que seja difícil saber em que casos a solução proposta é eficaz, e o quanto é eficaz. Eu não sei.

A propósito, quem ler a entrevista do Dworkin pode ficar curioso com a idéia do "seguro hipotético". Se eu me lembro bem (e por que eu me lembraria?), a idéia é mais ou menos o seguinte: suponha que, todo mundo na sua sociedade se reúna, receba uma graninha igual, e esqueça o que sabe sobre a própria vida (se é rico ou pobre, homem ou mulher, doente ou saudável, jovem ou velho, etc.), mas não sobre os riscos que poderá correr (o risco de ficar doente, de ser vítima de preconceito, de ser pobre, de morrer, etc.). Calcule o seguro que cada um aceitaria, racionalmente, pagar por cada um desses riscos, mande todo mundo de volta pra sociedade, e pague o seguro para quem for vítima de cada um desses problemas. É uma derivação, eu acho, da "situação originária" do John Rawls.

Se eu tiver entendido errado, por favor, corrijam-me.

Eu adoro pato



Diante das reclamações da Sra. Blogonete e da pequena blogoninha de que um blog de política sério não poderia incluir a frase "Eu adoro pato", resolvemos fazer uma homenagem a essa singela criatura tão injustiçada.

Monday, July 30, 2007

Lula e os Cubanos

Deu no Blog do CM:

"Ontem à noite nos bastidores do Maracanã pelo menos um dirigente cubano, comentava que Fidel não desculpa Lula por este não ter detido os quatro cubanos que desertaram da delegação ao Pan-07. -Afinal -dizia- no momento que a chefia da delegação os considerou fugidos, eles passaram a ser clandestinos no Brasil o que obrigava a polícia brasileira a detê-los e devolvê-los a seu país. É assim com qualquer clandestino em qualquer país do mundo, completou o dirigente."

Em tempo: a legislação brasileira prevê acordos de extradição com vários países, mas descarta a extradição de presos políticos. Se Lula extraditasse os cubanos mesmo sabendo que eles sofreriam represálias políticas, estaria cometendo crime.

Pan no Rio

É difícil negar que o Pan do Rio foi um sucesso, ou pelo menos, não foi um fracasso como se esperava. Certo, o Governo deu dinheiro pra fazer uns três Pans, o César Maia fez um, sabe-se lá onde foi parar o dinheiro dos outros dois, mas, enfim.

Não houve incidentes de violência, e, à exceção dos esportes praticados na cidade do rock (baseball e softball), os equipamentos funcionaram bem. Segundo gente que foi lá ver, o estádio de atletismo é ótimo. A festa fez bem para a auto-estima da cidade, que estava precisando.

O desempenho esportivo também foi muito bom, com recorde de medalhas. Quem quiser reclamar que o Pan não se compara à olimpíada, que reclame. Eu acho uma besteira. Não é porque não somos melhores que a China ou a Rússia que não podemos comemorar ser melhores que o Canadá ou a Argentina, por exemplo. Não é o melhor, mas também é bom.

Cuba e Iraque

Interessante o artigo do Newton Carlos na Folha de sábado. Trechos mais importantes:

"Numa reunião do Council on Foreign Relations, entidade de ponta no "establishment" diplomático americano, foram lembrados dois erros graves dos Estados Unidos no Iraque: a destruição do Exército iraquiano e do partido Baath, de Saddam Hussein, instituições-chave que mantinham a integridade do país invadido.

O conselho implícito é de que os Estados Unidos não cometam "os mesmos erros" em Cuba, onde também só há duas instituições, o Exército e o Partido Comunista. Terão de lidar com eles em qualquer iniciativa futura. O Exército, por exemplo, estendeu sua influência muito além do campo militar.Generais são ministros do Interior e do Açúcar e procurador-geral. Militares treinados no exterior em escolas de condução de negócios estão à frente de cerca de 300 empresas com o controle de 80% das exportações de mercadorias e de parcelas consideráveis dos ganhos em turismo e serviços.Um general, vice-ministro da Defesa, dirige o Grupo de Administração Federal, "holding" do Exército. Controla lugares turísticos, como o Cubanacan, uma cadeia de casas de câmbio, a aviação civil, a Marinha mercante e empresas de pesca."

Friday, July 27, 2007

David Brooks

O David Brooks, comentarista conservador bastante inteligente do NYT, escreveu um artigo dizendo que a economia americana não vai tão mal, não. Não sou assinante do Times Select (infelizmente), por isso não tenho acesso ao artigo inteiro. Muita gente falou mal (vejam a lista no Hermenauta), e o Tyler Cowen defendeu. Vi um resumo do artigo no FYI e comentei lá, quem quiser ver dê uma passada (e aproveite para ler os outros posts do blog).

Agora, tem um argumento que eu já vi feito em outros lugares e que eu tenho que criticar na frente de todo mundo. É o seguinte: certo, a desigualdade nos EUA subiu, mas o fato é que os mais ricos estão trabalhando muito mais horas por semana, enquanto que os pobres têm mais horas de lazer. Ou seja, os ricos estão ganhando mais porque trabalham mais.

O argumento é falso, pois:

Não há Cristo que me prove que os retornos para cada hora adicional de trabalho são os mesmos para pessoas em diferentes pontos da curva de renda. Se você é pago por hora, seu rendimento vai crescer linearmente a cada hora que você trabalhar a mais: assim, se você ganha 1 dólar por hora e trabalha mais uma hora, você ganha 1 dólar a mais. Se trabalhar 8 horas a mais (por exemplo, o sábado inteiro), seu salário cresce 8 dólares (e seu fim de semana vai pro saco). Por outro lado, se você é pago por rendimento, 8 horas a mais podem ser a diferença que vai permitir a você atingir uma meta da empresa e ganhar um bônus que pode dobrar seu salário.

Ou, dito de outra forma: se o mesmo prêmio fosse oferecido aos mais pobres, eles trabalhariam tanto quanto os ricos. A menos que se refute essa afirmação, o argumento citado pelo Brooks não se sustenta.

Logo: QUANDO SE FALA DE DIFERENTES CLASSES SOCIAIS, as horas trabalhadas são CONSEQUÊNCIA de se ter empregos bons que pagam bem. Não devemos utilizá-las, portanto, para explicar o quanto se ganha. Claro, dentro de cada classe - onde a relação hora/rendimento é mais ou menos a mesma - usar a variável é perfeitamente legítimo.

PS: hoje os links para o FYI e para o Cowen devem entrar aí do lado.

Thursday, July 26, 2007

Subsídios Agrícolas

Essa é pra vocês ficarem deprimidos. Quem acompanha a discussão sobre a rodada de Doha da OMC sabe que o que emperra aquele negócio (do nosso ponto de vista) são os subsídios que os países ricos dão a seus agribusinessmen. Pois, bem, segundo essa reportagem do New York Times (que eu vi no Daniel Drezner), as condições da agricultura americana no momento seriam ideais para o governo cortar os tais subsídios: os fazendeiros americanos estão enchendo a burra de dinheiro e o governo precisa conter gastos. Mas não, eles não vão cortar nada, porque os dois partidos têm medo de perder meia dúzia de deputados nas próximas eleições. Que beleza.

Wednesday, July 25, 2007

Efraim Filho

Vocês já devem ter visto a história do deputado Efraim Filho (DEM-PB), que, baseado em sua interpretação pessoal da caixa preta da TAM, afirmou que o piloto do avião não tentou arremeter. Acabou que era só a opinião dele, não o fruto de qualquer investigação técnica. Enfim, mais um caso de deputado brasileiro falando besteira, nem dá mais manchete.

Mas o que me chamou a atenção foi o PFL ter mandado um moleque desses para uma missão importante como acompanhar a abertuda da caixa preta nos EUA. É, sem dúvida, mais um esforço do partido para promover novos quadros à linha de frente do partido, afastando dos holofotes os nomes ligados ao regime militar (que, não tenho dúvida, continuam mandando). Daí Rodrigo Maia, ACM Neto, e Efraim Filho, que é, bem, filho, enfim, do Efraim, o Morais, ex-deputado. Lembremos, foi o caso do Collor.

O que é notável nisso aí é que toda essa turma é filho ou neto de figurões do partido. Não houve a mais pálida tentativa de recrutar jovens políticos talentosos da base. A molecada caiu de para-quedas em postos de direção sem nunca ter ralado em trabalho de base. Agora me digam, com essa formação política - política é um bico que papai me arrumou - o que se pode esperar dessa garotada em termos de renovação da cultura política brasileira?

A idéia de "Novos Nomes" perde um pouco a graça quando consiste apenas no acréscimo de "Jr." aos nomes velhos.

Enchentes em Oxford



Hoje no UOL havia a notícia de que a cidade universitária de Oxford foi evacuada por causa das enchentes. Na verdade, a coisa está feia, mesmo, mas só algumas partes dos arredores da cidade (Botley, em especial, onde tem um pub que vende um sanduba bom) foram evacuadas. Pode ser que a cheia atinja a área central, mas ainda não atingiu gravemente, pelo que eu pude entender da BBC (se bem que encheu o gramado do Christ Church). Agora, a interrupção do serviço de trem é realmente gravíssima, porque muita gente trabalha em Londres, e muita gente que trabalha em Oxford mora em cidadezinhas perto (essas sim, muito efetadas pela cheia do Tâmisa).

Como eu sou um sujeito prudente, só morei em beira de rio enquanto estava lá. Perto de casa (das duas) havia placas de "Flood Risk", e uma multidão de patos (eu adoro pato).

A foto aí de cima é de Port Meadows, um pasto público perto de onde eu morava. Pois é, um pasto público. A regra é medieval, e continua em curso: quem quiser levar sua vaca pra comer grama lá é só levar. É perto do rio (que, normalmente, é muito mais estreito do que na foto), e um lugar muito bacana para passear. Andando pelo pasto para uma vilazinha ao norte da cidade tem um Pub espetacular (esqueci o nome) na beira do rio, onde, por algum motivo, vivia um pavão. Não sei se pavão nada, mas, se não nadar, esse já foi pro saco. Port Meadows é um dos lugares que eu mais gosto no mundo.

Como ninguém mais aguenta a situação, Amiano Marcelino já foi chamado de volta para Oxford para por ordem na casa.

Monday, July 23, 2007

Tatyana Zaslavskaya

Reportagem interessante na Open Democracy sobre a Tatyana Zaslavskaya, socióloga russa que lançou o slogan "Perestroika" bem antes do Gorbachev. O legal da reportagem é dar uma idéia do que foi fazer sociologia na URSS (dêem uma olhada nos dois artigos citados no final do texto). A sociologia não era aceita na URSS porque, vocês já imaginam, a sociedade socialista não tinha os problemas - desigualdade, racismo, crime, etc. - que justificavam sua existência no ocidente. Certo, então beleza.

Aberturas para a sociologia só ocorreram timidamente durante o período Kruschev e nos países do chamado socialismo reformado, como a Hungria (onde, aliás, houve uma bela safra de economistas independentes, como o excelente Kornai), a Iugoslávia e a Polônia.

Mas, mesmo nesses casos, a abertura não foi lá essas coisas: o maior sociólogo do Leste Europeu foi o Iván Szélenyi, que nos anos 70 foi encarregado de estudar um projeto de habitação popular de sua Hungria natal. Deixaram o cara fazer a pesquisa, e quando ele foi apresentar os resultados, eis que ele descobriu que os caras do partido andavam abocanhando as melhores casas (que beleza). Censuraram. Szélenyi acabou se mandando para os EUA, onde se consagrou profissionalmente. Em 1993, coordenou, juntamente com o Donald Treiman, um grande projeto de pesquisa em seis países do Leste, cujos dados, para quem estiver interessado, estão disponíveis na Internet.

Pois bem: a crer na reportagem, a turma do Putin já começou a encher o saco dos sociólogos de novo.

Hitchens

Excelente resenha do Christopher Hitchens sobre um livro que reúne artigos do Marx jornalista. Realmente vale a pena.

Outro dia vi o Hitchens citado como "jornalista com famosa militância de direita". Na verdade, o Hitchens é um sujeito meio estranho. Sua fama de direitista veio recentemente, pelo apoio apaixonado que deu à Guerra do Iraque. Mas até alguns (bom, vá lá, alguns e mais um pouquinho) anos atrás ele era trotskysta, escreveu livro com o Edward Said, e descia o pau em todo mundo. Agora ficou famoso (e rico) por ter escrito um manifesto ateu ("God is Not Great"), que tem cara de ser uma merda (amanhã escrevo sobre isso), mas já desqualifica ele como típico republicano. Se quiserem ler um negócio bacana dele, leiam o livro sobre o Orwell, muito legal.

Vejam como o mundo ficou complicado: havia, no jornalismo inglês, a história dos "irmãos Hitchens", o Christopher esquerdista e o Peter, Tory de carteirinha. Na guerra do Iraque, o Christopher apoiou a guerra e, se não me falha a memória, o Peter foi contra.

PS: quando lerem a matéria do Hitchens, não deixem de prestar atenção no anúncio do Guardian com os presidentes americanos.

Livraço: The Right Nation, de John Micklethwait e Adrian Woolbridge





Para vocês terem idéia de como esse livro é bom, o Micklethwait virou editor da The Economist depois de escrevê-lo. É de 2004, se não me engano, mas só agora tive tempo de ler.

O livro é um estudo sobre a "Nação à Direita", o conservadorismo americano. O tema é fascinante para quem gosta de política: o conservadorismo americano é um movimento organizadíssimo (o que não quer dizer centralizado), que atua em várias frentes - cultural, política, religiosa - e consegue eleger presidentes conservadores no país mais capitalista (isto é, onde "tudo que é sólido" tende a "se desmanchar no ar") do mundo.

Não dá para resumir o livro, alguém tem que traduzir e vocês têm que ler. Mas aqui vão algumas idéias discutidas, e comentários.

Há algumas tendências da história americana que favorecem uma nação à direita da Europa desenvolvida. Em primeiro lugar, dizem os autores, a geografia: os amplos espaços disponíveis para os poucos colonizadores garantiam que o sujeito que normalmente viraria um proletário pobre nas cidades conseguisse se tornar proprietário nas terras à Oeste.

O Wild West formou algumas das tradições do conservadorismo norte-americano, como a preferência por sentenças criminais severíssimas, típicas de áreas de expansão de fronteira, onde o Estado é fraco para impor a lei. Ao mesmo tempo, produziu a peculiaridade do conservadorismo americano, se contraposto ao europeu: o conservadorismo americano é um movimento expansionista e otimista, não defensivo ou nostálgico. É resultado da combinação de grandes oportunidades de lucro com o risco permanente de anarquia, característicos da fronteira, que geram uma ideologia ao mesmo tempo dinâmica e rígida.

Se os autores conhecessem a história brasileira, talvez preferissem dizer que não foi a geografia o fator preponderante, mas a atitude política diante da geografia. Se bem me lembro das minhas aulas de história, um dos episódios mais polêmicos de nossa história foi a famosa Lei de Terras, que declarou que as terras devolutas eram do Estado, o que matou na origem o processo de "corrida para o Oeste" no Brasil (ou, pelo menos, fechou-o aos pobres).

Há, além disso, a religiosidade intensa - grande parte dos primeiros colonos era formada por dissidentes religiosos, e a separação entre Igreja e Estado, longe de enfraquecer a religião, fortaleceu-a, pois, conforme era a intenção dos founding fathers, forçou as Igrejas a irem atrás dos fiéis ou irem à falência.

E há o fracasso da esquerda americana em lidar com a herança dos anos 60. Reagan conquistou vários eleitores democratas dizendo "Não foram vocês que deixaram os democratas, foram os democratas que os deixaram". A partir do momento em que os democratas passaram a defender fanaticamente as bandeiras dos anos 60 (como, por exemplo, o direito ao aborto até quase o dia do nascimento, só revogado faz uns dois anos), perderam grande parte de seu eleitorado. Os negros, por exemplo, a mais sólida maioria democrata, também são um eleitorado mais religioso que os brancos. Lembram do que a Jandira Fhegalli fez na última eleição para o senado no Rio? Então, os democratas também fizeram, com o mesmo resultado.

Finalmente, há uma espécie de dinâmica global em curso: muitas das idéias novas (goste-se ou não goste-se delas) têm vindo da direita. A esquerda cada vez mais fala de "defesa dos direitos", "defesa da soberania", mas fica só na defesa, mesmo.

Agora, há uma tensão fundamental dentro do conservadorismo americano, que pode ser resumida entre os republicanos "não mexam no meu dinheiro" da Costa Oeste, representados pelo Reagan e, hoje em dia, pelo glorioso Schwaznegger, e a turma do cinturão bíblico, representada pelo Bush e sua turma. O problema é o seguinte: se é verdade que a maior defesa da direita vem do coração da América, também é verdade que esses são os setores com menos condições de competir economicamente. As áreas mais dinâmicas são ou controladas por republicanos Costa Oeste (minoritários dentro do partido) ou por democratas (ou, ainda, por republicanos meio democratas, como esses prefeitos de Nova Iorque que são repbublicanos mas defendem o direito ao aborto, os gays, etc.). Esse último ponto ainda enfatiza que essa diferença de interesse econômicos também são acompanhadas de diferenças de valores: o Schwaznegger está pouco se lixando se os gays quiserem casar, mas para a base do Bush isso provavelmente traria o apocalipse.

Enfim, livraço.

Bruno Gaspar

Certo, nessa eu vou queimar meu filme, e já espero a queda de audiência. Mas, enfim.

Quando eu vi a cena do MAG e seu assessor, o Bruno Gaspar, me ocorreu que o tal do Bruno podia ser um aluno de quem eu fui monitor (Política III - Teoria do Estado). Mas achei o cara meio diferente, a imagem não é muito nítida, e calculei que o cara era novo demais para estar nessa (não sei se já tem 30).

Mas eis que a Paulinha me diz aí nos comentários que é o cara, mesmo. Daí que eu vou dizer o seguinte:

Esse cara é muito bom. Foi um dos melhores alunos que eu vi no curso, muito inteligente, mesmo, e bastante idealista. Eu ainda era militante do PT na época, e às vezes ele covnersava comigo sobre o movimento estudantil (minha drug of choice no começo dos anos 90), o PT, essas coisas. Me lembro dele comentando que estava meio desorientado porque, ideologicamente, se identificava com o PT moderado da Articulação, mas se sentia incomodado com o jeito pesado deles fazerem política dentro do partido (na época ainda não se falava em corrupção, mas o Dirceu já tinha sido re-cooptado pelo Lula depois do racha de 1994, e atuava como disciplinador das tendências radicais). Concordamos que o certo era apoiar a Articulação ideologicamente - defender o PT social-democrata - mas não entrar nas jogadas mais pesadas, como a intervenção no PT do Rio.

Acabou que o que me encheu o saco no PT foi justamente isso, a dificuldade em escapar da escolha entre moderados que estavam fechando muito o espaço de discussão dentro do partido e um bando de radicais que só falavam merda (dando razão, vale dizer, à liderança que não queria ouvi-los). Muita gente até hoje não entendeu isso: a Heloísa Helena não é o oposto do Zé Dirceu, é a justificativa do Zé Dirceu.

Enfim, o Bruno parece ter entrado direto na política, o que pode ser muito bom para o país, pois trata-se de um quadro com grande potencial, independente do que o meu glorioso partido possa ter feito com ele nesse meio-tempo. Se ele se queimar de vez nessa história, eu acho que sairemos perdendo.

Friday, July 20, 2007

Troféu "A Classe do Estadista" 2007

Nem o Arthur Virgílio, que já tinha virado hors-concours do troféu, compete com essa do glorioso Marco Aurélio Garcia



É evidente que os caras não estão comemorando o acidente, mas, mesmo assim.

Widget do Pan

Botei um widget do Pan aí do lado. Achei bacaninha.

Coalizão no Iraque (2)

Para quem se interessar por isso, aqui vão alguns verbetes da Wikipedia sobre os grupos insurgentes que se uniram no Iraque: a Brigada da Revolução de 1920 (um grupo que, evidentemente, olha longe no futuro) é uma turma islamista que tira seu nome da revolta contra o Império Britânico em (dã) 1920. A crer na Wikipedia, se mantém fora da guerra civil contra os xiitas, e, corre o boato, já teve conversas com o exército americano, por ter denunciado a turma da Al-Qaeda (a Base para o Jihad na Mesopotâmia). O Hamas iraquiano é uma dissidência da Brigada 1920 formada esse ano (de maneira que não sei se significa tanto assim eles terem feito uma coalizão). O Ansar-al Sunna parece ser curdo ou ter vínculos com islamistas curdos (que se opõe ao regime curdo, semi-independente). Embora tenha se aproximado da Al-Qaeda em um dado momento, agora parece estar brigando com ela.

A impressão que dá é que são movimentos islamistas, não sei bem com que grau de radicalismo, mas que não estão afim de fazer guerra civil contra os xiitas, ao contrário da Al-Qaeda, que quer ver o circo pegar fogo.

Thursday, July 19, 2007

Frente no Iraque

Três grupos armados Suni no Iraque acabam de formar uma frente para negociar a retirada dos EUA: as Brigadas da revolução de 1920, a Ansar-al Sunna, e o Hammas Iraquiano (esse deve ser uma beleza). Em tese, poderia ser uma boa notícia, visto que os caras renegam tanto a Al-Qaeda quanto o Ba'ath, e a notícia poderia ser o começo de uma negociação de paz.

Bom, tomara que seja, mas os sinais iniciais não são muito bons, visto que os caras não aceitam conversar com quem tiver participado das instituições iraquianas durante a ocupação, afirmam a nulidade de todas as leis promulgadas durante o período, mas não dizem a) que leis colocarão no lugar, nem b) se pretendem fuzilar todo mundo que participou do sistema político iraquiano nesse meio tempo, o que inclui os sindicatos, o partido comunista, grupos liberais e de mulheres, etc.

A notícia saiu no Guardian.

Fatwas mais imbecis de todos os tempos

A Foreign Policy acaba de eleger as fatwas (decretos islâmicos) mais idiotas de todos os tempos. Entre as tristes, como a condenação da vacina da pólio, destaque para a fatwa contra o Pokemon e a contra o sexo entre pessoas nuas (mesmo casadas), que, segundo a revista, foi recebida pelos muçulmanos às gargalhadas.

Wednesday, July 18, 2007

Acidente em Congonhas

Li no UOL que a pista de Congonhas foi entregue sem as ranhuras que escoariam a água em caso de chuva. Rapaz, se for mesmo verdade eu não tenho nem ânimo para comentar.

A propósito, dêem uma olhada no Hermenauta e vejam o sistema de segurança do JFK, que parece bastante razoável, e custa só 4 milhões de dólares.

Tuesday, July 17, 2007

Jade e Ouro

Jade Barbosa

A Jade Barbosa fez uma apresentação espetacular, mas acabou caindo no final, em parte, talvez, pela algazarra que o ginásio estava fazendo. Até aí, parabéns para a menina por ser boa pra cacete no que faz - eu achei que foi ela que nos deu a prata nas equipes. Não é disso que eu vou falar.

O que me dá nervoso é a corja de vagabundos que sai falando, é perdedora (veja posto do Nel Mezzo), brasileiro é assim, mesmo, não nasceu pra vencer, essas coisas. Não vou discutir com isso. Só vou deixar claro: se você acha isso você é um merda. Fora daqui. Não tem nada que eu queira explicar que você seja capaz de entender. Eu já raspei da sola do meu sapato coisas com maior capacidade de reflexão do que você. O meu cachorro peida em um dia médio mais neurônios do que você jamais comportou em sua caixa craniana deformada. Se houver um demônio, se o demônio tiver hemorróidas, se houver um ser tão torpe que não seja aceito como vizinho pela associação dos moradores da hemorróida do demônio, esse ser é o Anjo Gabriel comparado a você.

A única tarefa cultural dos brasileiros, de direita de esquerda, de cima e de baixo, flamenguistas e vascaínos, é erradicar completamente esse estado de espírito da identidade nacional.

Parabéns à Jade, que salta como um anjo, e parabéns às menininhas americanas que ganharam.

PS: hehehe, Jade acaba de conquistar o ouro. Way to go, girl.

Monday, July 16, 2007

Wall Street Journal, que feio

O WSJ fez um editorial meio picareta com um graficozinho tão sem-vergonha que até eu sei que está errado. Olhem o gráfico aqui no Hermenauta, me digam se a linha que eles colocaram no gráfico é a "best fit", e aproveitem para ler os comentários que o Hermenauta listou (eu vi originalmente no Brad De Long, que vou linkar aí qualquer hora).

Scheinkman e a criminalidade

Muito bom o artigo do José Alexandre Scheinkman na Folha domingo. Dado assustador: em uma estimativa conservadora, a violência nos custa 5% do PIB. E pesquisas mostram que a criminalidade reduz o crescimento das cidades. Vale a pena ler.

Vaia ao Lula, etc.

Muita gente anda dizendo que a vaia ao Lula foi orquestrada pela turma do CM, o que é evidentemente verdade. Agora, uma coisa é dizer que a turma do CM começou a vaia, outra é dizer que todo mundo que vaiou vaiou por causa disso. Se Lula não tivesse perdido apoio na classe média carioca, seriam só os caras da Juventude César Maia (por mais assustador que seja, isso existe, sim, formalmente, um esquema meio juventude hitlerista) vaiando num canto.

De qualquer forma, faltou espírito esportivo ao Lula: deveria ter feito o discurso mesmo assim.

Mas CM pode ter cruzado uma linha: até o final do PAN, ninguém vai atrás dele pelos gastos 4 vezes maiores do que o previsto (e a necessidade de investimento federal mais ou menos 20 vezes maior do que o previsto). Mas quando acabar a festa, vão, sim.

Agora, muita gente que eu conheço anda discutindo o seguinte: o CM tem fama de muitas coisas, mas nunca teve fama de corrupto. É óbvio que a diferença de preço foi toda roubada. Mas foi roubada por quem? Pela turma do CM, mesmo, ou por que outra turma?

De qualquer forma, aqui também a trégua vale. Agora eu vou é torcer (espetacular o cara da ginástica olímpica de pé quebrado, não?)

Thursday, July 12, 2007

O eixo do mal-governado

Aliás, nosso companheiro Chávez está tentando formar uma espécie de aliança dos países mais mal-governados do mundo, juntando Venezuela, Bolívia, Bielo-Rússia, Irã (segundo maior exportador de petróleo do mundo, enfrentando racionamento de gasolina), Zimbabwe. Temo que uma hora dessas ele queira convidar os dirigentes do Flamengo para serem chefes desse negócio.

Aliás, se vocês quiserem ler um negócio engraçado sobre o eixo do mal, não deixem de ler isso aqui. É atribuído ao cara do Monty Phyton, mas parece que não é dele, não. Eu, se fosse ele, assinava mesmo assim.

Lá se vai o Zimbabwe

O Zimbabwe não aparece muito aqui no noticiário, mas devia: o governo do ditador Robert Mugabe é um dos mais desastrosos do mundo, e condena à mais absoluta miséria um país que tinha tudo para ser um dos mais desenvolvidos da região.

Mugabe era considerado um governante mais ou menos razoável desde a independência até a hora em que um outro sujeito resolveu se candidatar à presidência e pareceu que ia ganhar. Daí em diante partiu para a ignorância, e fez uma peculiar reforma agrária, em que a terra dos fazendeiros brancos foi confiscada e redistribuída para os figurões do governo. De posse de fazendas espetaculares, os caras conseguiram levar a agricultura à falência em um ano (e, vejam que beleza: um deles agora está na comissão de desenvolvimento sustentável da ONU). Mugabe passou a recrutar moleques para um campo de escoteiros do mal, onde os garotos aprendem a espancar adversários do regime e estuprar coletivamente meninas. Quando disseram que ele parecia o Hitler, ele disse que seria "dez vezes o Hitler".

Adquiriu o hábito de sequestrar famílias em favelas majoritariamente de oposição e levar para o campo, para eles readquirirem sua identidade camponesa: as famílias eram levadas até o sertão lá do Zimbabwe e soltas no meio da mata seca, sem qualquer alimento, instrumento de trabalho, semente, ou água. Muita gente morreu na beira da estrada tentando voltar para uma cidade.

A crer nesse artigo da Wikipedia, o desemprego atualmente no Zimbabwe é de 60% da força de trabalho. Os juros estão em 70%, a inflação está em mais ou menos 1.500.000%, há fome e racionamento de comida.

O Daniel Drezner já fez um bolão para saber em quantos meses o Zimbabwe colapsa, e a The Economist também diz que a coisa está feia.

Agora, nesse contexto, quem seria filhodaputa de ser amigo do Mugabe? Só outro filhodaputa. Que, aliás, outro dia disse que a Bielo-Rússia, última ditadura da Europa, era um modelo de estado social como o que ele queria criar em casa.

Wednesday, July 11, 2007

Voltaram os Títulos

Voltemos agora à nossa programação normal

Tuesday, July 10, 2007

Saramago começa a perceber

O Saramago, que tanta besteira já falou sobre Cuba, resolveu mandar bem e dar uma cutucada na esquerda latino-americana, em especial as FARC. Disse o provecto e Nobélico escriba, reproduzido no UOL:

"BOGOTÁ, 9 Jul 2007 (AFP) - O prêmio Nobel de Literatura (1998) José Saramago alertou nesta segunda-feira a imprensa colombiana para uma "tentação autoritária" observada em setores de esquerda que chegaram ao poder na América Latina.Saramago concedeu uma entrevista coletiva em Bogotá, cidade designada como a capital mundial do livro pela Unesco e onde o escritor português participa de uma conferência sobre o uso do livro como instrumento da paz.

José Saramago disse que a esquerda "sofre uma espécie de tentação maligna que é a fragmentação" ao responder a uma pergunta do jornal El Tiempo sobre o ressurgimento de governos desta tendência na América Latina; deu a entender que mantinha suas reservas."Há uma tendência autoritária em muitos países. Nada restou dos ideais", afirmou o prêmio Nobel, que também adotou um tom crítico com relação aos grupos armados que atuam na Colômbia, incluindo as guerrilhas de esquerda.

"Há desaparecidos, seqüestrados, paramilitares e guerrilheiros que, no começo, suponho que tivessem vontade de mudar algo, mas se tornaram seqüestradores e narcotraficantes, e o pior é que eles já não saberiam viver de outra forma", lamentou."

Mickey Hamouse

Bom, até que o Blogger corrija o problema, postaremos sem título. O título desse seria, ou "Mickey Hamouse", ou "Al Disney", ou "Farfour se Fourdeu".

O Hamas tinha um programa infantil em que um rato igual ao Mickey - o glorioso Farfour - ensinava as crianças como é legal ser terrorista. Pois é. Infelizmente, devemos anunciar que ontem o valoroso combatente Farfour encontrou o martírio nas mãos dos israelenses. Sabemos de fonte segura que já se encontra no paraíso, onde uma multidão de Minnies virgens satisfazem todos os seus mais sórdidos desejos, à beira de um rio de queijo suíço derretido. Entretanto, companheiros, não desanimem! O sheik Pateta já organiza a resposta ao ocupante sionista!



Agora, falando sério, que coisa triste.
Alguém sabe porque eu não consigo colocar título nos posts? A caixa do título parece não funcionar, por isso não pus nada hoje nem ontem.

Thursday, July 05, 2007

Grande Calligaris

Excelente, muito bom mesmo, o artigo do Contardo Calligaris hoje na Folha sobre os playboys filhosdaputa que resolveram espancar uma trabalhadora. Trecho:

"(...) a inteligência humana tem limites, a estupidez não tem. Essa diferença aparece sobretudo no comportamento de grupo. Imaginemos que a gente possa dar um valor numérico à inteligência e à estupidez. E suponhamos que o valor médio seja dois. Pois bem, três sujeitos mediamente inteligentes, uma vez agrupados, terão inteligência seis. Com a estupidez, a coisa não funciona assim: a estupidez cresce exponencialmente. A soma de três estúpidos não é estupidez seis, mas estupidez oito (dois vezes dois, vezes dois). Quatro estúpidos: estupidez 16. Cinco: estupidez 32.

Curiosamente, essa regra vale até chegar, mais ou menos, a um grupo de dez. Aí a coisa tranca: a partir de dez, torna-se mais provável que haja alguém para discordar da boçalidade ambiente. Não porque, entre dez, haveria necessariamente um herói ou um sábio, mas porque, num grupo de dez, quem se opõe conta com a séria possibilidade de que, no grupo, haja ao menos um outro para se opor junto com ele.

Esse funcionamento, por sua vez, decai quando o grupo se torna massa. É difícil dizer a partir de quantos membros isso acontece, mas não é preciso que sejam muitos: um grupo de linchamento, por exemplo, pode desenvolver toda sua estupidez coletiva com 20 ou 30 membros. "

Comentário meu: é por isso que eu gosto de política: política é um monte de dinâmicas como essa, mas com enfrentamentos em campo aberto.

Wednesday, July 04, 2007

Ha-Joon Chang

Ainda na Prospect, o economista famosão Ha-Joon Chang escreve algo que me parece muito parecido com o que o Brasil defende na OMC: o livre-comércio, a longo prazo, é uma beleza, mas todos os países desenvolvidos adotaram o protecionismo até serem fortes o suficiente para competir.

O argumento parece razoável, embora haja algumas inadequações: por exemplo, Chang afirma que o Brasil começou a adotar medidas neoliberais nos anos 80, o que não me parece verdade. Por outro lado, alguém pode discutir a premissa do artigo: o que deu certo no passado (o protecionismo) é o que dará certo agora? Talvez sim, talvez não.

Gordon Brown

Algumas visões de Gordon Brown, novo primeiro-ministro da Grã-Bretanha.

A sempre excelente Prospect faz uma edição especial sobre Brown o Intelectual. Lendo os artigos tem-se a impressão de um cara inteligente e CDF, que já foi fã do Gramsci, e tem uma certa fama de estar à esquerda do Blair, como acredita esse cara da LSE entrevistado pela Carta Capital. Por outro lado, foi o chanceler do tesouro que deu autonomia ao banco central, e parece tender mais para o lado mainstream na gestão da economia (que aprendeu na marra, meio como o Palocci, mas onde tem fama de entendido). E, vejam que interessante, parece ser um cara muito preocupado com a moral, na tradição da esquerda religiosa (Brown é membro da Igreja da Escócia), nessa vertente da esquerda que se preocupa com a dissolução da comunidade pelo individualismo, essas coisas. A crer nos artigos da Prospect, admira alguns autores da direita americana que escreveram sobre o assunto.

E, para complicar mais o quadro, é um dos caras que falam mais sério a respeito de ajuda internacional para o desenvolvimento (me lembro quando se comprometeu a comprar grandes quantidades de vacina para a malária, se alguém a descobrisse; a malária talvez tenha sido a doença que mais matou gente até hoje, mas ninguém descobre a cura, entre outros motivos, porque os consumidores em potencial são duros).

Finalmente: é, como o Blair, uma tremenda raposa política. Foi esperto o suficiente para apoiar o Blair e só derrubá-lo dentro do Labour quando viu que ia ganhar.

Aparentemente, Brown até que se saiu bem em seu primeiro question time, momento semanal em que o primeiro-ministro vai até a câmara dos comuns e fica sendo detonado pelo líder da oposição, enquanto os parlamentares de cada lado gritam "iiiihhhh!!", "uuuhhhhh!!!!", "eu não deixava!", essas coisas de briga de recreio.

Tuesday, July 03, 2007

Graduate Tax

Inspirado na pergunta do RDC: a graduate tax é um imposto cobrado dos alunos de universidade pública que, depois de formados, alcancem um certo nível de renda. Há várias versões da proposta, mas a que me parece mais interessante é a graduate contrubution, que é cobrada apenas por um tempo limitado de tempo. A experiência de política semelhante mais bem-sucedida do mundo é a da Austrália.

As várias formas de graduate tax (ou graduate contributions) tentam conciliar três princípios:

1) Uma enorme parte da desigualdade de renda é causada pelas desigualdades educacionais, mas o acesso à universidade ainda é, mesmo em países europeus que oferecem universidade gratuita aos seus cidadãos, fortemente condicionado pela origem de classe dos alunos (a exceção, se não me engano, é a Suécia, onde essa desigualdade caiu bastante nas últimas décadas). Isso quer dizer que a educação superior potencializa desigualdades pré-existentes: quem consegue conclui-la é o sujeito com mais dinheiro, que se distancia ainda mais da média da população por ter obtido seu diploma. Dado que, seja por subvenção seja por isenção fiscal, grande parte da educação é patrocinada pelo gasto público, é preocupante que dinheiro dos contribuintes faça a desigualdade crescer: na prática, os contribuintes pobres pagam para que os contribuintes ricos aumentem sua vantagem sobre eles. Naturalmente, uma das frentes para se combater o problema é procurar facilitar o acesso de mais pobres à universidade (o que, o exemplo sueco parece sugerir, depende inclusive de reduzir a insegurança econômica dos pais, o que libera os filhos a ficarem sem trabalhar durante a faculdade). Mas outra maneira de lidar com isso é taxar os universitários pela vantagem de mercado individual obtida com ajuda do gasto público coletivo. O dinheiro assim arrecadado poderia ser reinvestido na universidade, fazendo com que mais pobres possam cursá-las.

2) A cobrança de mensalidades, longe de resolver o problema, agrava-o, pois o acesso de estudantes pobres se torna ainda mais difícil. Naturalmente, se todos os custos da educação superior forem cobertos pelas mensalidades (isto é, sem dinheiro público envolvido de nenhuma forma), poder-se-ia argumentar que a graduate tax seria injusta. Mas a educação 100% financiada por mensalidades é muito rara, e impossível em áreas onde a pesquisa é muito cara e os retornos profissionais comparativamente baixos (como na pesquisa básica). Portanto, se a USP, por exemplo, cobrasse mensalidades, elas jamais cobririam todos os gastos, e o subsídio restante seria distribuído de maneira mais injusta ainda do que hoje, visto que os alunos pobres não poderiam pagar. Isto se dá por um motivo simples, que é a distinção crucial entre a graduate tax e a mensalidade: a mensalidade é paga PELOS PAIS DO ALUNO, o que faz com que a origem de classe seja um determinante de sucesso crucial. A Graduate tax é paga PELO ALUNO, SE ELE SE DER BEM NO MERCADO, o que reduz muito (mas não totalmente, visto que os pais podem ajudá-lo) o peso do fator origem.

Um exemplo que eu conheço bem: eu. Eu (e, com boa probabilidade, você que está lendo) nasci em uma família nos 5% mais ricos do Brasil (o Brasil é tão desigual que o limite do 5% não é tão alto, não), e estudei em colégio particular (meio ruim, mas particular). Por isso, e por ser bom aluno, passei para uma universidade pública, onde fiz também mestrado. Depois consegui uma bolsa de estudos do governo para fazer doutorado no exterior.

Comparemos minha situação com a de um contemporâneo meu que tenha nascido na Rocinha, mas que também fosse bom aluno. Por melhor que fosse, não teria passado na mesma universidade que eu, o que garante que não passou no mesmo mestrado e nem, muito menos, ganhou a bolsa para o doutorado. Mas nós dois contribuímos para pagar a universidade e financiar o CNPq (segundo nossa renda, o que é o único critério justo).

Ou seja: quando nós terminamos o segundo grau eu devia ter uns 30%, 40% de qualificação a mais que o cara. Quando eu terminei a UNICAMP, já tinha 300%, 400% a mais, e, se o meu São Benedito me der uma força e eu conseguir acabar o doutorado, terei, tranquilamente, mais que dez vezes seu potencial de renda. A beleza da coisa, do meu ponto-de-vista, é que ele ajudou a pagar para que eu ganhasse essa vantagem sobre ele.

A educação é um bem posicional: seu valor de mercado depende de quão educados são seus competidores no mercado de trabalho (quando quase ninguém tinha curso primário, ter o secundário dava uma bela grana, etc.). Portanto, não parece muito razoável que um sujeito me pague para ganhar dele em um jogo em que eu já saí com vantagem.

Vale notar, é fundamental que a taxa só seja cobrada de quem realmente passar a ganhar bem em função de seu diploma: se o cara ficar desempregado, ou se ganhar muito pouco, não deve pagar nada. Se não for assim, o estudante pobre não poderá correr o risco de fazer o curso, pois não saberá se poderá pagar depois. Na Austrália, aparentemente, esse desestímulo não ocorreu.

Naturalmente, há várias formas de implementar essa proposta. A taxa pode ser vitalícia, ou só pelo tempo necessário para pagar o que o aluno custou (minha opção seria essa), pode ser a mesma para todo mundo a partir de um certo nível de renda ou pode ir se tornando progressiva, pode ser maior ou menor, etc. Um resumo das alternativas pode ser encontrado nesse paper do governo britânico.

No Brasil, houve uma proposta parecida com essa, apresentada pela deputada Selma Schons, do PT do Paraná. Como vocês podem perceber, não fez muito sucesso.

Monday, July 02, 2007

Blair no Oriente Médio

E o Blair resolveu ser o negociador da paz do Oriente Médio, provavelmente para limpar sua barra por ter apoiado a guerra do Iraque. A jogada é arriscadíssima: Blair começa na desvantagem de ser impopular na região. Por outro lado, pode ser um clássico "Nixon vai à China": é justamente o cara que é mais identificado com o outro lado que pode fazer concessões sem parecer fraco. Veremos.

Blog do Japajato!

E o glorioso japajato está de volta com um blog! Aparentemente, não conseguiu ainda voltar a usar o nome japajato, por isso seu novo blog está provisoriamente batizado de "O Oceano é Logo Ali", o que fica um pouco mais confuso ainda quando se lê o endereço URL (ultraseven lido em japonês). Certo, certo, parece estranho, mas japajato é uma grande fonte de sabedoria. O link entra aí do lado hoje como japajato, até ele decidir qual será o nome.