Tuesday, August 14, 2007

Rodrik vs. Tabarrok

Briga de cachorro grande na blogosfera econômica: o Dan Rodrik (link aí do lado em breve), professor de economia em Harvard, escreveu um artigo em defesa dos países fazerem política industrial. O Alex Tabarrok, que, junto com o Tyler Cowen, escreve o excelente blog Marginal Revolution (link já aí do lado) desceu a lenha, e o debate foi parar no Free Exchange, blog da The Economist (que concorda com o Tabarrok). O debate teve, inclusive, impacto na blogosfera brasileira, com o Hermenauta e o FYI "torcendo", respectivamente, pelo Rodrik e pelo Tabarrok. Se eu entendi, trata-se do seguinte:

Disse o Rodrik: os economistas aceitam a intervenção estatal em áreas como saúde e educação, mas não na indústria. No caso das políticas sociais, os argumentos a favor se baseiam na teoria das falhas de mercado, as externalidades positivas da educação, etc. Embora esses argumentos sejam intelectualmente muito plausíveis, e sejam indiretamente relacionados a pressupostos mais ou menos aceitos, ainda não existe um corpo de evidências empíricas muito sólido que os apóie. Mesmo assim, os economistas em geral continuam aceintando a intervenção com base neles.

Ora, a situação no caso da política industrial é exatamente a mesma: há argumentos baseados nessas mesmas teorias, igualmente plausíveis, mas sem grande sustentação em estudos empíricos. Não há motivo, portanto, para a gente não discutir, pelo menos, a conveniência de se fazer política industrial. Para apoiar seu argumento, o Rodrik lista alguns exemplos de políticas industriais que deram certo.

O Tabarrok caracterizou esse argumento como "o pior de todos os tempos", e reescreveu-o assim:

1 - Nós aceitamos umas coisas aí mesmo sem evidência empírica.

2 - Não temos evidência empírica a favor da conveniência de se fazer política industrial.

3 - Devemos, pois, aceitar a conveniência de se fazer política industrial.

Foi essa versão que o blog da The Economist aceitou. Mas, se vocês prestarem atenção no argumento do Rodrik, ele não é esse aí, não (que seria mesmo uma droga). A base do argumento é a tal das teorias da falha de mercado, que, pelo que eu sei, é amplamente aceita (o que não quer dizer que sua aplicação nesse caso o seja). Nos comentários do Marginal Revolution, o vosso mané aqui tinha que dar um pitaco, e reformulou o argumento assim:

"1 - Economists support state intervention in some areas where there is no rock-solid empirical evidence for it, ONLY PLAUSIBLE THEORETICAL CONSIDERATIONS LOGICALLY DERIVED FROM USUALLY ACCEPTED PRINCIPLES, OF WHICH WE HAVE ONLY INDIRECT EMPIRICAL EVIDENCE (the whole market failures discussion).

2 - Some of these theoretical considerations should apply to industrial policy.

3 - We therefore should be open to discuss the convenience of industrial policy."

Daí em diante o negócio pode ser verdadeiro ou falso, mas não é trivialmente errado, como sugeriram o Tabarrok e o Free Exchange.

Acrescento mais dois pontos:

1) Acho que aceitamos o argumento no caso da política social porque consideramos a perspectiva das crianças ficarem fora da escola tão horroroso que não queremos correr o risco das falhas de mercado ocorrerem. Somos mais céticos no caso da política industrial porque não consideramos um crescimento econômico sub-ótimo tão terrível assim para correr os riscos associados à intervenção do Estado (corrupção, ineficiência, etc.). Mas, como me chamaram a atenção lá nos comentários, isso é só especulação.

2) Não sei como se poderia fazer um teste econométrico da conveniência de se fazer política industrial, acho a variável "política industrial" ampla demais: involve subsídios, barreiras alfandegárias, políticas de inovação e incentivo, enfim, um monte de coisas diferentes. Mas, enfim, não é porque eu não sei fazer que é impossível.

10 comments:

Anonymous said...

Cara, eu ia abrir um blog só para tratar dessa discussão que poucos se hbilitaram na blogosfera nacional. Foi logo após ter lido o blog da The Economist que fiquei tentado. Mas agora eu acho que você tratou do assunto todo.

Eu estava ficando do lado do Rodik até a resposta dele ao Marginal Revolution. Ele conseguiu enfraquecer o ponto de vista, explicitando um pouco o seu ponto de partida quando disse:

"They (os libertários) envisage a real good world out there that looks like nothing we have now (or have ever had), and they want us to get there."

Bem foi ele quem propôs uma política, como você disse, sem a menor base empírica, apenas na observação "eles fizeram isso e não atrapalhou, outros fizeram a mesma coisa e deu errado". É muito pouco. Poderíamos ver qualé, tentar mais intervenções industriais? Não concordo, mas mesmo que se experimente, foi flagrante inverter o caso e dizer que é o Tabarrok que "seem impervious to evidence". Mesmo porque não foi o próprio Rodrik que alegou não ter evidências empíricas nem para as questões de Educação, etc?

De todo jeito, ficou sem responder como "desanular" o seu argumento, ou melhor, the worst argument ever.

E Tabarrok finalizou bem:
"The libertarian economists are revolutionaries, however, not because they are immune to evidence but because they respect evidence so much that they are unwilling to accept "conventional wisdom" simply because it is conventional."

Cara, vejo que estamos em desacordo, mas tenho que te parabenlizar pelo post.

Na Prática said...

Grande RDC, eu também achei a resposta do Rodrik uma merda. O final da discussão ficou, se me perdoam a expressão, meio com cara de debate brasileiro.

Pra falar a verdade, ainda não sei se o Rodrik falou a verdade, só acho que o Tabarrok e companhia não deviam ter dito que era trivialmente errado, pior argumento do mundo, etc. Não tenho conhecimento econômico para dizer quem está certo, mas isso eu digo: ninguém ali está obviamente errado.

Agora, se você desistir de fazer seu blog o resto da blogosfera nacional vai querer me encher de porrada! Tenha piedade! Tá certo que eu tenho pelo menos um leitor que só vem aqui pra ler os seus comentários (que beleza, o cara ainda tem a cara-de-pau de me dizer isso), e ele provavelmente passaria a ler direto do seu blog. Mas vale o sacrifício.

Está lançado aqui o Movimento Pró-blog do RDC!

Anonymous said...

haha tem tanto blog bom por aí, incluindo os que estão na sua coluna de links. Quase todos, na verdade, o do Alon e do Idelber são meio bobinhos quando se metem em assunto para adultos, não saíram da caverna de militância esquerdista dos anos 80. Não tenho saco. Enfim, fora isso, tem um monte de blog bacana por aí, vejo algumas análises que não via há dez anos atrás (e são bananérrimas lá fora). Os blogs evoluíram muito porque têm muito mais referência (viva a globalização!) e conseguem se situar num debate mundial com muito mais gabarito. Tive uma coceira na mão porque ninguém falava da polêmica blogal do Rodrik (até a The Economist se meteu) mas passou.

Valeu pela sugestão, mas o que eu gosto mesmo é de dar pitaco nos textos dos outros - e imagina se eu vou deixar outros chatos fazerem isso comigo.

Anonymous said...

Claro que a intervenção estatal na industria não funciona. Essa estória de stalinismo é uma grande falácia e a URSS passou de merda à superpotência de 17 a 53 graças à iniciativa privada e ao empreendedorismo da burguesia comunista. Na verdade é tudo uma grande conspiração da Heloísa Helena para ocultar tudo de bom que a livre iniciativa promovida por Stalin fez de bom por aquele país, daí dizem que o cara era comunista e tal.

Anonymous said...

E a China e os tigres asiáticos?
Vocês leram o texto?

Anonymous said...

Outra briga de economista (na justiça!)
Lott vs. Levitt. Lott processa o freakonomista e perde.

Para ir à página, cole pedaço por pedaço, na ordem, na barra de endereços...
http://chronicle.com/
temp/email2.php?id=
XsnkHnwQfdW9nM3F6BjnrgV3dFfXFkrt

Na Prática said...

Grande Anônimo, não cheguei a ler o paper inteiro, não. Na verdade, como eu disse, acho que depende do que você entender por política industrial.

RDC, vou dar uma checada nisso daí, valeu.

Anonymous said...

Eu ainda tô lendo o paper do Rodrik. Acho que ele caiu em uma armadilha, tentou ser freakanomista.

Sempre achei que uma das grandes atrações que a escola de economistas liberais exerce sobre a moçada é essa idéia de que eles mantêm viva a chama de um certo saber iniciático, capaz de virar o mundo de ponta cabeça. O freakanomics no fundo é isso. E é apenas uma nova versão da coisa, que tem antecedentes ilustres como o "armchair economist", o qual também exerceu o mesmo tipo de influência sobre gerações passadas de economistas. É o estilo da peripécia, tão sedutor que já estava lá na "Poética" de Aristóteles.

Tenho a impressão que nas páginas iniciais do seu texto o Rodrik tentou fazer um raciocínio do mesmo estilo _ mas se deu muito mal. Tanto é que ele se contradiz: em uma hora chega a dizer que mesmo a necessidade de política industrial é "sketchy", e depois cita uma porrada de papers, inclusive alguns dele mesmo, demonstrando algumas falhas de mercado.

A discussão dá pano pra manga, mas concordo com seu argumento, acho. Afinal, na política industrial, se você errar, terá deixado ricos alguns empresários. Nas políticas sociais terá selado o destino de milhões de pessoas. É outra escala. E cá entre nós, também acho que a rationale para políticas sociais não seja nada escassa, acho que o Rodrik decolou na maionese.

Na Prática said...

Fala, Hermenauta! Parece mesmo que o Rodrik tentou dar uma enfeitada e se deu mal. Agora, eu continuo achando que "política industrial" é um termo meio vago. Por exemplo: política de inovação é política industrial? Se for, eu sou a favor da política industrial. Mas se política industrial for bolsa-milionário no BNDES, sou countra.

Anonymous said...

Pois é...até mexer no câmbio é política industrial, né?

Eu não tenho muita simpatia pela tese do "campeão nacional" e outras que tais. Inclusive o que tem de empresário brasileiro que recebe grana do BNDES e assim que a empresa está nos trinques vende para um sócio estrangeiro não está no gibi.

Mas reconheço que na Coréia, por exemplo, foi assim que fizeram.

Se quer saber, acho que o problema é que o empresariado nacional não está nem aí.